quinta-feira, 6 de outubro de 2011

livro Cesar Ferrera ( Euripdes)

Eurípedes

Quando conheci o advogado Eúrípedes Brito Cunha,

eu já estava com mais de 23 ou 24 anos. Se o tivesse conhecido

adolescente com certeza teria me estruturado

para ter mais qualidade de vida por toda minha existência.

Os bons sentimentos que demonstrou por mim não

estavam condicionados por eu ser filho de A ou irmão de

B. Houve uma simpatia mutua, humana, espiritual.

Nenhum médico neurologista ou psiquiatra que

tive a oportunidade de conhecer para tentar me ajudar a

superar ou amenizar os meus problemas existenciais me

ajudou tanto quanto Eurípedes, que era advogado.

Convivendo com ele, no mínimo aprendi que demonstrar

'~'ntegridade não era evitar cair em qualquer

tentação, mas sair dessas o mais rapidamente possível

quando, percebidas. Integridade não faz com que seja

impossível cometer erros, mas é o que possibilita consertá-

los.

Na mesma convivência entendi que a liberdade desejada

não nos impede de cumprir nossas responsabilidades.

Como alguém poderia considerar-se livre sabendo

que deixou de cumprir suas obrigações? Não fazer o "

que deve ser feito escraviza a própria alma que sente-se

livre quando sente as tarefas cumpridas.

Não recordo se Eurípedes era religioso. Sei que res-

. peitava todas as religiões. Em uma das nossas conversas

conclui que todo mundo quer o livre arbítrio, mas

poucas são as pessoas que o sabem reconhecer em cada

momento em que vivem ou em cada atitude que tomam.

Livre arbítrio não devia ser para todos. Devia ser alcançado

na medida em que houvesse realmente evolução

espiritual que leva a evolução mental.

Para mim, Eurípedes tornou-se um irmão mais

velho. Acima do irmão estava o mestre ou o guru .que

minha mente e alma tanto precisava. Ele tinha o dom

de me valorizar como ser humano. Parece que somente

enxergava a minha capacidade de fazer, de criar, de

gostar de ser útil. Muitas vezes ia com ele para o Fórum

Rui Barbosa ou para o prédio da Justiça do Trabalho.

Ele saltava correndo para as audiências e eu ficava com

o carro dele até surgir uma vaga para estacionar. Gostava

quando eu arrumava os livros na grande estante do

escritório de advocacia que ficava em um prédio na rua

da Bélgica.

Também era comum me dar dinheiro para comprar

do bom e do.melhor visando suprir o apartamento dele

para receber os colegas e amigos nas noites de sexta-feira.

O pessoal começava a chegar ao escritório por volta das

16 horas. Depois seguiam para qualquer barzinho para

o aquecimento com cervejas. Em seguida iam todos para

o apartamento dele ouvir boa música da excelente discoteca,

saborear o melhor em vinhos e uísque importado,

degustando delícias de frutos do mar.

Eurípedes gostava de carros grandes, vistosos, imponentes,

conseqüentemente caros. Certa vez comprou

um Maverick Ford motor V8 na versão mais luxuosa.

Era o veículo dos sonhos de quase todo advogado bem

sucedido. A compra foi feita em uma concessionária autorizada

da Ford da cidade de Feira de Santana. Salvo

engano os proprietários eram clientes dele. No dia marcado

para ir buscar o veículo surgiu uma importante au;-

diência. Ele então telefonou pedindo-me para ir buscar

o carrão. Claro que quase tive um orgasmo. Fui de ônibus

e voltei no lindo automóvel. Lembro que o gerente

da concessionária estava meio indeciso em me entregar

o veículo. Olhe que levei um bilhete por escrito autori- .

zando a entrega. Antes disso, Eurípedes tinha telefonado

dizendo que eu ia pegar o carro. Mesmo assim o gerente

estava cabreiro. Tive que circular em algumas ruas da

cidade para ele conferir minha performance.

O que não faltou na minha vida foram pessoas como

o gerente da concessionária duvidando da minha competência.

Escasso pessoas como Eurípedes. Se existissem

mais pessoas como ele na minha estrada da vida eu poderia

ter sido um pouco mais feliz ou menos infeliz.

POf.toda a existência meu pai deve ter comprado em

agências uns quatro ou cinco carros zerinho. O mais imponente

um Opala GM branco. Nenhum deles eu tive o

prazer de tirar da concessionária.

Também foi Eurípedes quem assinou a minha primeira

carteira de trabalho como se empregado fosse do

escritório dele. Além de assinar fazia as contribuições

previstas pelas leis do trabalho. Graças a ele tive acesso a

previdência social. Quando meu primeiro filho nasceu,

a primeira pessoa que apareceu na maternidade para

visitar foi ele. Pensei em pedi-lo para batizar o garoto.

Não me achei à altura de ter aquele expoente do Direito

como meu compadre
Com os meus complexos de inferioridade terminei

distanciando-me de Eurípedes. O escritório dele na rua

da Bélgica terminou. Pelo que sei, está em moderníssimo

escritório no Itaigara. Atua com o filho que tem o

mesmo nome. A última vez que estive com ele foi no

enterro de meu pai.

Enquan~o vida tiver e se não tiver o Mal de Alzaimer

o prof Dr. Eurípedes Brito Cunha será sempre sinônimo

de dignidade humana. Pena que não encontrei na

medicina ninguém que fizesse por mim o que ele como

advogado fez como ser humano.

Por merecimento foi eleito Presidente da Ordem

dos Advogados do Brasil, secção Bahia. Salvo engano

por dois mandatos.

Não foi muito feliz no amor. Acho que o grande

amor da vida dele era o Direito. Além do Direito os três

filhos, quero crer, todos advogados como ele

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