É uma longa história.
Estudar Direito Penal é um grande atrativo, evidentemente que isto não ocorre pelo crime em si , naturalmente, que é ato repulsivo, mas pelas teorias jurídicas, psicológicas que procuram explicar a existência do crime e do criminoso, que sempre despertam nos estudiosos , sobretudo nos estudantes do Direito, grande interesse e, por essa via, o atrativo pela advocacia criminal.
Não fui à regra, e para este meu pendor , muito contribuíram as atraentes aulas,do culto mestre Aloísio de Carvalho Filho, que oferecia lições em oratória impecável e bastante agradável, sem exageros de palavras rebuscadas ou orações construídas com a preocupação de impressionar o alunado fascinado. Eram aulas tranqüilas, compreensíveis, de clareza ímpar.
Discorria o professor Carvalho Filho, ( que era também senador da República) , sobre as diversas teses que procuram explicar a existência do criminoso e do crime. Dentre estas a que mais fascinava, certamente, era a teoria lombrosiana, emanada do cérebro brilhante do estudioso médico psiquiatra italiano, Lombroso ( daí o nome da teoria), hoje já sem qualquer aplicação na realidade , mas vale como história do estudo da criminalística.
Em resumo, e do que me lembro, Lombroso afirmava que o criminoso nasce criminoso e apresente características físicas facilmente identificáveis, cais como: maçãs dos roso salientes, assimetria na envergadura entre a altura e os braços abertos ( estes apresentariam um tamanho maior, o seria uma anomalia, já que os braços abertos de um homem deve ser igual à sua altura), e dispunha da qualidade de não sentir dor física – era a analgesia.
Eis, em síntese o retrato do criminoso lombrosiano.
O estudo desta e de outras teorias constituíam um verdadeiro atrativo para os alunos enveredarem pelo estudo do Direito Penal e para o exercício da advocacia criminal.
Como era natural, não fugi à regra e o fiz não só pelos motivos expostos, como pela necessidade de subsistir.Então comecei a minha advocacia , ainda estagiário ( era possível até fazer audiências sozinho como estagiário, desde que constasse da procuração um advogado responsável), atuando no Direito Penal e no Direito do Trabalho.
Guardo na memória alguns casos da advocacia penal que penso valer a pena serem narrados considerando suas peculiaridades, relembrando a vivência de tempo românticos da advocacia..
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Havia uma previsão legal que qualificava como crime “ seduzir mulher virgem, aproveitando-se de sua inocência e justificável confiança.”. Era o crime de sedução, cujo autor estava sujeito a pena de prisão. A peculiaridade processual encontra-se no fato de que, sendo a vítima pobre, o crime era de ação pública e se rica, era, então de ação privada, dependia de representação. De toda sorte, como é sabido, ao Ministério Público cabia o direito de intervenção no processo.
Não se encontra-se entre suas exigências a idade, bastava eu fosse virem e fosse enganada pelo sedutor., aproveitando-se de sua inocência e da confiança que conseguisse adquirir junto à vítima.
Fui então procurado por um jovem empregado da Petrobrás, que o acusava de haver seduzido sua filha pai de uma jovem que o acusava de haver a sua filha , oferecendo-se presentes e prometendo-lhe casamento.
O meu cliente negou categoricamente tais fatos, sem negar que realmente namoraram e mantiveram relações sexuais, mas insistia em que não a seduzira, mas ao contrário fora seduzido. Informou – e que, como empregado da Petrobrás, viajava constantemente e , em razão dessas ausências de Salvador, passava dias em outras localidades. E acrescentou que era sempre surpreendido pela presença da suposta vítima, que era pobre, portanto o processo seguia o Ito da ação pública, com a presença fiscalizadora e acusadora da Promotoria Pública.
Feito o inquérito policial, o Promotor formulou a denúncia , aceita pelo juiz e instaurado o correspondente processo crime. Apresentada a defesa prévia, arroladas testemunhas, segui -se a instrução . Depoimentos, testemunhas, impugnações, discussões.
Comecei a ver que meu cliente dissera a verdade: fora seduzido. Em Salvador, estava a moça sempre em sua casa ( ele era solteiro) .Viaja, olha ela no novo endereço do acusado. Transferido para outra localidade,não demorava nada, olhe a moça em sua cola!
Então, resistir, quem há de?
Aconteceu o inevitável. O difícil, então era fazer a prova. Mas o jovem tinha sorte e arrolou pessoas das diversas localidades em eu serviu e que viam a suposta vítima procurar pelo acusado.
Diante da prova, encerra a instrução, com a palavra as partes para as alegações finais, a surpresa, o Dr. Promotor de Justiça pediu a absolvição do acusa.
Um bom começo, pensei.
MAIS UMA SEDUÇÃO
Nesse passo, surgiu outro cliente, outro sedutor.
Tratava-se de um jovem que consertava aparelhos de televisão nos domicílios, transportando -se numa Kombi, onde também se encontravam as ferramentas necessárias ao seu trabalho. Neste caso, procurou – o seu pai, um senhor português, de quem havia eu sido advogado em uma causa comercial. Expliquei – lhe que se tratavam de situações diversas e que há algum temo eu não mais trabalhava em direito penal. Meio enfezado, o homem respondeu que ou eu defendia o seu filho ou “o menino vai pra cadeia”
Situação difícil. Terminei aceitando o patrocínio da causa, também de ação pública. Como agia o acusado: levava a Kombi com as ferramentas , trazia os televisores para a Kombi e junto com eles, as moças da família, que, não entendo por quais razões, caiam em sua lábia.
Ocorre que ele já era casado e casado para se livras oura acusação semelhante, o que já ornava a defesa difícil e a prova ainda mais difícil. A certa atura comecei a sentir que a prova conduzia a demonstrar sua responsabilidade penal e não via maneira de evitar aquela situação.
Pedi, então, vista dos autos. E os retive em meu poder o tanto que pude. Vou, então passando pelos corredores do fórum e ouço um chamado,: Eurípedes, Eurípedes!. Voltei – me, era o juiz do caso, que foi me dizendo logo: “Eurípedes você tá prendendo aquele processo de sedução, né? Ta aguardando a prescrição né?”. E eu com cara de inocência: eu doutor, estou examinando a prova já feita, compulsando os autos para ver a o rumo da defesa. “ Coisa nenhuma. Vou mandar apreender os autos”Tenha paciência douro, vou devolver,,sim, logo. Respondeu ele, fingindo acreditar: “ vou aguardar um pouco mais”.
Bem , deixei de passar pelo corredor onde estava a sala de audiências criminais, e permaneci de posse dos autos até prescrever. Mas me encontrei novamente com Sua Excelência.: “Eurípedes , mas você heim? deixou prescrever a ação, né?” O que fazer, abracei - o em agradecimento.por sua compreensão, trata-se de um jovem de pouco mais de 20 anos que estava iniciando a vida e iria vê –la destruía por uma acusação já meio fora de moda , tanto que, realmente veio a desaparecer da legislação.
POR FIM UM
Tive um cliente,este realmente criminoso, que roubara o banco em que trabalhava como caixa. Primeira curiosidade, procurou – me através da lista telefônica ( o único em minha vida que veio pelo endereço telefônico) .
Contou – me logo que realmente se apropriara de certa quantia, aproveitando-se da ausência do ouro colega e da demora do chefe da seção que fazia a arrecadação do dinheiro do caixa e só veio a dar pela falta numa recontagem feita com o supervisor.Aí não tinha mais como comprovar a culpa e a responsabilidade do caixa desonesto.
Defendi –o negando o fato e o banco não conseguiu fazer nenhuma prova a respeito.Suspeitas e nada mais. E ainda fiz reclamação trabalhista em razão haver ele sido despedido sem receber as verbas pela “ injusta “ despedida e ele recebeu tudo aquilo a que não tinha direito.
ENCERRO MINHA CARRREIRA CRIMINAL
Depois desse caso, resolvi encerrar a minha breve carreira de advogado criminalista , até porque as audiências nas Delegacias são marcadas de acordo com os plantões dos delegados , e enveredam pela madrugada, sábados, domingos, feriados, qualquer dia, e também o crime tomou novos caminhos , outras vias as quais não vale a pena trilhar.
Depois contarei, apenas o caso de Aristides, este inocente, acusado de receptação, um velho motorista de taxe, aqueles ainda de gravata e paletó, cabelos grisalhos.
Nunca mais o crime .
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